Manoel. Um nome sagrado, derivação de uma das identidades nominais de Jesus Cristo: Emanuel (que quer dizer: “Deus conosco”) – Mateus, 1: 23.
Manoel. De Barros. Um dos mais brilhantes, geniais e líricos poetas da língua portuguesa. Este, (o de Barros), certamente significa “a literatura sempre conosco”.
Filho do chão mato-grossense, Manoel de Barros nasceu em 1916, no Beco da Marinha, em Cuiabá (MT). Todavia, logo com dois meses de vida, mudou-se junto com sua família para Corumbá (MS).
Foi aqui, nesse pedaço de vida que Manoel debruçou grande parte da genialidade de sua obra: a infância no Pantanal. A condição de criança, o vocabulário infantil e as percepções inocentes de um garoto em contato com a natureza representam pilares importantíssimos na obra do poeta.
Manoel de Barros mudou os rumos da literatura brasileira através da profundidade abismal de sua simplicidade. A vida no campo, o trabalho árduo e braçal da lida na fazenda representam o coração pulsante de sua poesia.
Seus personagens são os bocós, que nada mais são do que as crianças, os trabalhadores e idosos do Pantanal, para os quais, Manoel inventou até um dialeto próprio: “o Idioleto Manoelês” que permite “agarrar o vento pelo rabo, infantilizar formigas, construir abridores de amanhecer e manejar esticadores de horizontes”.
Choveu de noite até encostar em mim. O rio deve estar mais gordo. Escutei um perfume de sol nas águas. (Manoel de Barros em “Livro Sobre Nada”).
Manoel de Barros bagunçava a gramática de um modo genial. Seu brilhantismo era tamanho, que ao poeta não era suficiente os substantivos, adjetivos e verbos já existentes: ele criava novos, invertia o uso das palavras. Utilizava substantivo como adjetivo, verbo como substantivo e inventava seus famosos brinquedos com palavras.
A utilização do vocabulário coloquial-rural e de uma sintaxe que homenageia a oralidade e a oralitura, ampliaram as possibilidades expressivas e comunicativas léxicas através de neologismos.
E o mais curioso de tudo, é que Manoel de Barros passou praticamente cinquenta anos escrevendo no anonimato. O poeta só foi “descoberto” aos 72 anos de idade. Foi o que escreveu o jornalista Millôr Fernandes, na década de 80, quando produziu um artigo sobre o escritor: “Nasce um poeta aos 72 anos de idade”.
Tenho o privilégio de não saber quase tudo.
E isso explica o resto. (Manoel de Barros em “Menino do Mato”)
Foi só a partir daí que Manoel de Barros ganhou projeção nacional. Dentre as principais honrarias recebidas, ganhou o Prêmio Jabuti de Literatura (1995), o Prêmio Nacional de Literatura do Ministério da Cultura (1998) e o Casa de Las Américas (2012).
Publicou uma rica extensão poética de valor lírico e cultural únicos. Imortalizou-se em obras como “O Livro das Ignorãnças” (1993), “Livro Sobre Nada” (1996), “Tratado Geral das Grandezas do Ínfimo” (2001), “Poemas Rupestres” (2004), “Menino do Mato” (2010), e “Escritos em Verbal de Ave” (2013).
Manoel de Barros morreu em 2014, aos 97 anos, em Campo Grande, no seio do Pantanal que tanto o inspirou durante a vida. Foi homenageado em 2016 e 2017 respectivamente pelas escolas de samba Sossego e Império Serrano. Ambas as escolas contando sua vida, sagraram-se campeãs.
O ocaso me ampliou para formiga (…) o infinito do escuro me perena. (Manoel de Barros em “O Livro das Ignorãças”)
O poeta deixou uma lacuna impreenchível. Assim como Shakespeare, Fernando Pessoa e Machado de Assis, só nasce um Manoel de Barros a cada mil anos. No fim de sua vida, conforme suas próprias palavras, Manoel era poeta em “tempo integral”. Acordava, tomava o café da manhã e reclusava-se em seu escritório, onde criava.
Uma vez, perguntaram-lhe se aquilo que ele escrevia, era ficcional. Se a poesia do escritor era verdade ou mentira. Ele respondeu: “Noventa por cento do que eu escrevo, é invenção. Só dez por cento é mentira.”
Gostou? Quer ler mais um pouquinho sobre Manoel de Barros? Clique aqui e confira mais uma resenha sobre o poeta, dessa vez, de autoria de Caio Carvalho.