O Brasil não está em decadência musical. Para provar isso, iremos te apresentar o talentoso produtor, instrumentista, compositor e músico Pêra Illipronti, que está divulgando o seu disco “Confio Em Minhas palavras”. No bate-papo que tivemos com Pêra, ele demonstrou estar totalmente envolvido com a música brasileira, advertendo que o rap é a música brasileira que mais tem no momento, e finaliza “Viva o RAP”. Pêra além de falar do disco, explica seus processos criativos, coloca em pauta a importância de influências de outros tipos de arte em sua música, e por fim fala do rap como maior representante da música brasileira. Veja:
1 – Qual é a definição deste novo EP?
A definição deste EP, que é meu primeiro trabalho solo, é o estado de consciência da confiança.
Vamos dizer assim: na narrativa das músicas eu sempre mostro os dois lados de uma situação da vida. Não vou falar o bem e mal, o claro e o escuro, o baixo e o alto. Você define como quiser, pode ser o A e o B, pode usar o que achar melhor para compreender. Eu trabalho esses dois lados, e defino esse estado de consciência através da contradição, dessa linguagem de que tudo tem dois pontos de vista, e que podemos chegar no mesmo lugar através de um pensamento não unificado. Provando portanto que cada ser humano deve ser respeitado igualmente e ter a liberdade de escolher o que é melhor para si sem interferir na integridade física e moral do seu companheiro de TERRA (nosso querido planeta). As vezes a gente esta certo ou errado em CONFIAR ou DESCONFIAR, questionar o que é preconceito, o que é intuição faz parte desse processo de consciência sobre a confiança. Porque somos condicionados a desconfiar da sombra quando anoitece em nossa querida SP ou em qualquer lugar do mundo onde a prioridade seja os grandes negócios? Pensando nisso e ouvindo o EP, fazer as pessoas questionarem o porquê ela confia e o porque ela não confia.
2 – A proposta deste novo EP é narrar diálogos e situações (amor, espiritualidade, política e sociedade). Por que você escolheu esses temas? De que forma você dialoga musicalmente e poeticamente com eles?
Eu escolhi esses temas porque eles são generalizados, e eu quis mostrar nessas situações específicas (amores, espiritualidade, política e sociedade) de que a gente tem que praticar em situações simples. Quando eu falo de amor é um estado de confiança de um com o outro. O amor é coletivo. A espiritualidade é pessoal, mas como você entende ou compreende como? No coletivo! Ninguém vai pra igreja sozinho. Todo mundo aprende as coisas no coletivo, na escola, no trabalho, e o que a gente esquece de praticar é o que devia ser ensinado todo dia e a todo tempo. Existem pessoas que vão para seus cultos, e aprendem ensinamentos lindos, mas praticam com seus companheiros próximos e esquecem de passar adiante na rua e no dia a dia, onde seria a prioridade maior na minha opinião.
Na política é a mesma coisa, como vou confiar em alguém que nunca vi na vida, nunca apertei a mão, o candidato mal sabe meu nome e ele me representa numa cadeira bonitinha no ar condicionado, enquanto eu e maior parte da população se FODE num busão?! Ele tá trabalhando pra mim, pra deixar o pais da maneira com que eu idealizo, mas eu nunca o conheci. Não faz nem sentido, isso que estou te falando parece uma loucura, mas é isso que acontece. Entende? A sociedade esquece simplesmente de olhar um pro outro e ajudar. As pessoas simplesmente agem como se não existíssemos.
Meu cabelo cresceu, e eu sou outra pessoa hoje, eu mudei. Quantas pessoas deixaram de falar comigo por simplesmente ter mudado? Mas se você para um pouco, e falar, eu vou mudar isso vai perceber que as pessoas perto de você vão mudar também e você continuara em uma eterna mudança, note o que você mudou e vai ver mudança ao seu redor.
3 – Em “Confio em minhas palavras”, você usa o humor junto a poesia. O que tem a dizer sobre isso?
Eu sempre gostei de humor. Na real, sempre usei humor nas minhas poesias. É que as piadas que eu contava nas músicas de amor era pra mim, agora estou compartilhando com vocês. (risadas)
Nesse trabalho eu quis usar o humor pra não ser uma coisa tão séria por tratar de assuntos importantes para o momento do país. O humor sempre esteve presente em mim, quem convive comigo sabe disso, e por isso se fez presente na escrita desse álbum. E confesso que não recebi criticas sobre isso até o momento!
4 – Em uma entrevista, você disse que teve influências de vários músicos, mas para nossa surpresa, também foi influenciado por artistas plásticos e pelo cinema. Como esses outros tipos de arte moveram sua música?
Comecei a estudar música no meio mais erudito, e nesse estudo você percebe que os compositores escrevem músicas a partir de um pedido solene de um rei, escrevem temas para um salmo da bíblia, ou para uma ópera ou um balé. Ou seja, nada é gerado através de um sentimento, o compositor escreve por causa de uma forma, ele poderia escrever sobre uma decepção, como muitos fizeram, mas ele busca o motivo em algo “concreto digamos”. E assim fui buscar essas essências em outros tipos de arte, isso que me moveu a buscar outras referencias. Me ajudou a compor não somente pelo o que sinto. Mas sim pela obra de outros artistas. A gente pode ir numa exposição, e se inspirar, e fazer uma redação, uma resenha, uma crítica, uma poesia, uma música ou até um quadro. O artista tem que lembrar que ele pode fazer isso. Exemplificando bem o artista OFI que criou o conceito da capa, usava os muros do RJ para apresentar seus personagens e assim usei aquilo como referencia para meu trabalho que causou o encontro para a capa do disco. Arte gerando + ARTE!
5 – Qual a linguagem poética e musical que carrega o EP?
Essa pergunta é difícil, porque eu misturo vários ritmos dentro do EP, eu não saberia dizer que linguagem. É meio que relacionando com a pergunta anterior, se você pensar que a linguagem que eu tô usando musicalmente pode ser a mesma linguagem que artistas plásticos usam, e pode ser a mesma linguagem que outros artistas estão usando. A gente só vai saber, dar nome a essa linguagem daqui há algum tempo, quem sabe em 15, 20 ou até 30 anos. O nome teórico que a gente pode dar pra essa linguagem é vanguarda ou contemporâneo ao nosso tempo, nesse momento.
6 – Como funcionou seu processo criativo para este novo trabalho?
Esse trabalho foi influenciado por várias coisas, discos, artistas plásticos, exposições e bastante filmes. Mas o ponto principal que ajudou foi a rua, foi vivenciar coisas com pessoas que eu não conhecia. E até hoje tem sido esse o conceito e experimento do trabalho de CONFIAR. Na turnê tenho tocado na rua, tenho tocado em espaços diferentes, desde festa de aniversário de amigos até em bazares, isso tem acontecido bastante, tenho me colocado nesse propósito de conhecer e estabelecer um diálogo de confiança com as pessoas. O que mais me influenciou foi a rua, onde vivi as coisas, troquei ideias com a galera e fui eu. Foi o que mais funcionou!
7 – Para você, qual a relação do rap com a música brasileira, e como você transmite isso em “Confio em minhas palavras”?
Pra mim o rap já está enraizado na nossa música. Eu tenho uma pesquisa sobre isso, sobre qual a relevância do rap na nossa música. E eu quero provar pra todo mundo, que o rap já está enraizado na cultura brasileira. Algum parente seu, por exemplo a sua tia-avó sabe quem é os Racionais MC’s. Ela sabe quem é o RAEL, EMICIDA, CRIOLO. Então a relação do rap com a música brasileira é enorme. Todo mundo sabe quem são esses artistas, e aí você vê que o rap tem uma linguagem pra falar com muita gente, e que toda essa gente aceita conversa. Não quero nem falar de mercado, porque o rap é um movimento muito maior do que só a música. O rap veio de um movimento que tem o grafit, o DJ, o MC e os BBoys e BGirls, que juntos formam o HIP-HOP. Tem a dança, a pintura, a música e a palavra, a poesia. E você junta essas 4 coisas, você tem uma coisa mais incrível ainda. A poesia é uma parcela importante. Ela tá na minha música, e dentro do EP o rap vem na música AMOR APP. onde tem um verso mais longo sendo declamado com um instrumental mais envolvente, a batida marca, faz dançar, e essa influência do rap na minha música, é grande se ouvir com atenção. O rap é a mistura de tudo. Você já ouviu rap com samba, com forró, com reggae, com rock, com bossa. Você vê que o rap mistura muita coisa. O Brasil em si, é um exemplo de que dá pra viver o mundo inteiro num só lugar. O Brasil é o coração do mundo, aqui tem todos os povos, e o rap mostra que dá pra misturar tudo. E por tanto pra mim o rap é a música mais brasileira que tem no momento. Viva o RAP!
Agradecimentos a Matheus Luzi, Revista Arte Brasileira e a todos meus companheiros de trabalho que fazem esse projeto acontecer (Rafael Castro, Edu Kastru, Gabriel Itajara e Samy Ferreira).