Nascida em 2013, em plea eferverscência da capital paulista, que o grupo Xaxado Novo anúncio o lançamento do álbum O SERTÃO CIGANO, que traz canções autorais e inéditas, e ainda conta com três homenagens à baluartes da cultura popular, com releituras de ÓIA A PISADA, XAXADO BOSSA NOVA e ORICURI, clássicos imortalizados por Luiz Gonzaga, Trio Nordestino e João do Vale.
O disco faz referência a variedade cultural que habita o sertão nordestino, principalmente quando o assunto é o isolamento geográfico e os povos que viveram nessas regiões, como os árabes, os escravos mouros, os ciganos e judeus. Nessa mistura, o álbum O SERTÃO CIGANO também traz muitos instrumentos pouco usuais, como a Rabeca.
Mias informações sobre o disco, você confere a seguir em uma entrevista especial que fizemos com Felipe Gomide, integrante da Xaxado Novo.
https://www.youtube.com/watch?v=vLHAz2qGaoc&ab_channel=XaxadoNovo
Já que vocês vêm da cultura do sertão, como vocês acham que estão contribuindo para este cenário com o álbum O SERTÃO CIGANO?
Somos nascidos na região sul e sudeste do país, e nos conhecemos na cidade de São Paulo, sede do grupo. Nesse caldeirão cultural, a influência da música nordestina é viva e pulsante, há gerações, desde os tempos em que Luiz Gonzaga veio fazer carreira no Rio de Janeiro, encantado e apaixonando todo o país. Infelizmente o peso da indústria cultural, vêm há algumas décadas, asfixiando a música regional e nordestina nos grandes meios de comunicação, dando preferência para estilos musicais importados, ou adaptados para formatos de massa, especialmente a música de influência americana e o fenômeno “pop”, fato muito documentado, inclusive pelos grandes compositores de forró.
Ficamos muito felizes em poder trabalhar a música nordestina, em todas suas variedades, resgatando o imaginário popular dos cangaceiros, vaqueiros e sertanejos, e ocupando espaços e casas de show, mais acostumados à estilos “globais”, resgatando inclusive instrumentos tradicionais, muitas vezes esquecidos até das grandes lojas de música da cidade, como a rabeca, o pífano e percussões tradicionais.
No mais, a influência da música árabe e cigana, tão fundamentais na estruturação da cultura poética e musical sertaneja nordestina, conforme documentado por diversos pesquisadores como Luis Soler e Mário de Andrade, aparece de forma explícita em nosso som, que traz diversas influências orientais, religando essa ponte tão rica das músicas do oriente com a música do nosso sertão brasileiro. Criando assim um novo estilo, com originalidade e tradição, bem contemporâneo, remexendo assim os mananciais da cultura musical do nosso Brasil.
Acho que seria muito interessante vocês nos contarem quais foram suas influências.
Nossas influências são diversas e variadas, especialmente por vivermos nesse caldeirão efervescente que é a cidade de São Paulo. Ao mesmo tempo em que amamos o côco, o maracatu, o pé-de-serra com todas suas variedades, as bandas de pífano, folias, fandangos, cirandas, reisados, sempre pesquisando a música regional brasileira, estamos sempre abertos e pesquisando também a música do mundo (especialmente a não-comercial), nas tradições árabes, ciganas, turcas, balcânicas, revirando diversas tradições musicais do globo, e sem deixar de lado a importância da MPB, da música brasileira instrumental, do jazz da música contemporânea.
E dessas influências, certamente surgiu o uso de instrumentos pouco usuais. Nesse sentido, quais são os instrumentos usados no álbum?
Nesse álbum ao vivo, conseguimos pela primeira vez, unir no mesmo palco instrumentos da tradição ocidental, com instrumentos regionais brasileiros e instrumentos orientais. Foi um sonho realizado, e assim temos a rabeca, violão, triângulo e surdo ao lado do piano, da sanfona, flauta transversal, baixo, violino. Do lado oriental, ainda temos o alaúde e o derbake, além de um sax soprano tocado no estilo oriental. Uma miscelânea que achamos que deu muito certo.
Qual é o público de vocês? Vocês alcançam o público sertanejo? Se sim, como essa relação acontece?
Nosso público é bem eclético e variado, o que nos deixa muito felizes. Pelas redes sociais atingimos públicos de diversas regiões do país, e percebemos que depois de São Paulo e Rio de Janeiro, nosso maior público fica sediado na região nordeste mesmo. Já tivemos a alegria de tocar na cidade de Exu, onde nasceu o mestre Gonzagão, a pedidos da própria comunidade, além de estados como Goiás, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Pará, Rio Grande do Sul, Maranhão, e por aí vai…
Sempre recebemos mensagens de apoio nas redes sociais, de pessoas muito variadas e de diferentes realidades, crianças, jovens, adultos e idosos apreciam o som o Xaxado Novo, o que nos faz continuar trilhando esse caminho, com muito amor e alegria. É sempre uma alegria, quando alguém assiste nosso show e diz que se lembrou da sua infância no sertão, de seus pais e avós, e que essa cultura continua viva.
A Xaxado Novo foi formada em 2013. O que esse meio tempo em que vocês estão na ativa contribuiu para a criação do conceito do álbum O SERTÃO CIGANO?
Nesse período fizemos duas grandes viagens de pesquisa cultural pelo nordeste, em cidades como Caruaru, Campina Grande, Arcoverde, Bezerros, Serra Talhada, Exu, Crato, Petrolina, Juazeiro do Norte entre outras, o que enriqueceu muito nosso arcabouço cultural, conhecendo mestres e tradições, diretamente na fonte. Além disso, fomos tocar em Istambul na Turquia, o que nos conectou muito com a cultura oriental. Tudo isso vêm nos enriquecendo muito, e especialmente a vida na estrada, passando por dezenas de cidades e festivais que sempre nos deixam muitos aprendizados, musicais e culturais.
Tem alguma história ou curiosidade interessante que envolva o álbum?
Recebemos o convite para tocar no Auditório Ibirapuera, faltando apenas um mês para o evento. Foi quase uma loucura decidirmos gravar tudo ao vivo, mas como todos convidados especiais tinham topado, grandes mestres musicais que somos fãs, não poderíamos perder a oportunidade. Assim, fizemos um intensivão de ensaios, e optamos por tocar apenas músicas próprias, ficamos quase um ano levantando os recursos para custear o disco, de forma independente, e com a ajuda de fãns e parceiros conseguimos lançar o disco.
Fiquem à vontade para falarem o que quiserem.
A música nordestina recebeu muitas influências dos povos orientais, especialmente árabes, que ocuparam a Península Ibérica por quase 800 anos. Nos primórdios da colonização, Portugal era ainda extremamente arabizado em sua cultura poética e musical. No sertão, essas influências se mantiveram muito firmes, enriquecidas por séculos de isolamento e uma rica natureza inspiradora. Nesse álbum, tentamos aproximar um pouco as culturas orientais e sertanejas, trazendo também elementos da música global, num verdadeiro caldeirão musical, recheado de tradição e experimentalismo. Alaúdes e derbakes ao lado de rabeca e triângulo, violinos e pianos, ao lado de sanfonas e flautas, esperamos que todos apreciem essa fusão musical, que tem o nordeste como seu principal referencial.