Neste novo EP, que marca a estreia da trilogia que Mani Carneiro irá lançar, sensações densas, intensas e leves são abordadas. Em todas as canções escolhidas para estarem nesse lançamento, é possível perceber claramente que o músico usou e abusou de sentimentos como solidão, saudade, amor, desamor, raiva, resignação, calmaria, vazio e preenchimento.
— Todas inerentes à existência humana e sua busca eterna de desenvolvimento. Nunca ficam de fora no fundo de qualquer expressão artística. Ao observar esse “diálogo de intensidades”, eu quis levar isso também para a sonoridade de cada uma das músicas. — comentou o artista.
Abaixo, você verá na íntegra uma entrevista especial que fizemos com Mani Carneiro:
Como o filme Blade Runner entra nesse EP?
O que não entendemos chamamos de acaso… eu estava para ver a continuação do Blade Runner que foi lançada no ano de 2017, mas antes quis rever o primeiro filme, de 1982, que marcou a geração dos que cresceram nos anos 80, minha geração, tanto pela visão de futuro e novas tecnologias, questionamento do que seria ser humano e especialmente para mim, a trilha sonora do Vangelis.
Tive um choque ao reassistir à parte final em que o ator Rutger Hauer, interpretando um android prestes a morrer, faz a cena mais humana do filme e diz, debaixo de chuva (da qual eu não lembrava): “agora tudo que vi se perderá no tempo, like tears in the rain (como lágrimas na chuva)”.
Plim! Caiu-me a ficha. Eu tinha que samplear aquilo e finalizar a CHOVE com isso:
“O Amor transborda em alma/like tears in the rain”.
Outra curiosidade é que o tom da trilha por baixo da cena é o mesmo da minha música e só descobri quando fui fazer a colagem. O mais bacana é que nada disso foi calculado.
Há várias narrações do cotidiano no EP. Quais narrações são essas?
São coisas que aconteceram no meu cotidiano, mas que fazem parte da vida de qualquer pessoa, como o questionamento do que seria um dia perfeito, em DIA DE SONHO faço uma espécie de provocação sobre essa reflexão de relatividade do que seja ou não real e digo: “(…) Eu voltei pra te mostrar/Que o real eu invento… vento… vento…” (…)
Em CHOVE, faço uma imersão pra refletir sobre internalizar a chuva e a saudade, em paralelo com a solidão. Em O VENTO E O TEMPO eu questiono o “tempo” entre duas pessoas para o amor se dar ou não… e DEPOIS DE AGORA fala justamente desse tal amor que acabou de acontecer, Ooou, acabou de acabar.
Esse é o primeiro lançamento de uma trilogia que vem por aí. O que podemos esperar desses futuros trabalhos?
Sim. Vou lançar 2 EPs antes de lançar o disco definitivo. Cada um desses três lançamentos virá com inéditas e o que posso adiantar é que os próximos lançamentos continuarão com boas colaborações de artistas e produtores e a “intensidade” continuará.
Quais são as expectativas?
Em 18 anos de carreira aprendi a não ter expectativas com a música. Apenas sentir e continuar fazendo. É minha melhor maneira de filtrar o mundo enquanto me comunico com ele.
E como foi dar o primeiro passo no lançamento dessa trilogia?
Aliviador! Poder partir pros próximos enquanto estou ainda sentindo a receptividade deste.
A masterização ficou por conta de Chico Neves que já trabalhou com nomes como Los Hermanos, Lenine, Nando Reis, O Rappa, Arnaldo Antunes. Como foi ter a participação dele no EP?
Na verdade ele está mixando e também masterizando minhas músicas. Foi uma parceria natural. Jam da Silva, que produziu a faixa DEPOIS DE AGORA e já foi produzido por Chico Neves, indicou o Chico pra isto. Topei na hora pois sou fã do trabalho do Chico há pelo menos 20 anos. É um craque na área de produção e audiotécnica. Uma sorte e honra poder trabalhar com ele. Tem contribuído bastante com a sonoridade final do disco.
Você também demonstrou estar numa fase nova com esse EP. Comente.
Toda fase de lançamento parece ser nova, mas na verdade ela só expõe uma vontade de transformação do autor que já estava em curso anos antes, muito por causa da demora entre o criar e o lançar. Quando lancei o CD ECOOU (2015) já estava super afim de fazer este de agora… como agora já estou pensando no próximo. Mas basicamente de ECOOU, que foi gravado ao vivo e era um disco mais acústico, para essas novas canções, a maior diferença está na sonoridade. As novas músicas estão vindo com mais peso, onde experimento mais texturas e combinações como baterias desmembradas e sintetizadores com violões, abertura de vozes, ou som de banda mesmo, coisa que não experimentava desde meus trabalhos anteriores.
Achei incrível essa sua fala: “No meu processo de composição elas mesmas se escolhem sozinhas e a mudança continua”. Comente.
Estava falando das canções. A gente pensa que está montando um repertório, mas como muitas vezes estas músicas vão vindo com a vida e muitas vezes a própria vida é transitória e mutante, então você que é escolhido pelas canções, na maneira como elas virão ou se darão como arte final em sua sonoridade e tal…. Entre o processo de compor até ir gravando, muito se transforma, como se a própria música apontasse um caminho. Eu sou muito intuitivo e deixo esse instinto definir as coisas. Muitas vezes aposto no risco e na dúvida.
Fale mais sobre o EP (Coisas que não perguntei e que você gostaria de ter dito).
Certo. O EP “Canções Para…”, assim mesmo de nome interminado para cada ouvinte, à sua maneira, definir para que servem as canções, para mim significa seguir com elas… E as reticências vão trazendo o mistério do que ainda vem por aí.