21 de março de 2025

[ENTREVISTA] Quem é Tim Maia? MV Bill responde!

MV Bill

(Capa do single/clipe)

 

Fã ácido de Tim Maia, o destacado rapper MV Bill enxergou em canção, uma bela forma de homenagear um dos mais fortes e marcantes representantes da sonoridade e atitude da música brasileira dos anos 70, ano em que se completa pouco mais de duas décadas da partida de Tim Maia.

“Após conhecer melhor a história do artista, percebi o quanto Tim era um cara 8 ou 80. O que ele tinha de talento, tinha de coração, bondade e generosidade, porém, também era um cara temperamental. Ele era a representação dos anos 70”, lembra Bill.

A música vem carregada com toda a importância da vida e carreira de Tim. Tudo isso alinhado a brilhante participação de Babu Santana, ator que sem pensar duas vezes, topou mais uma vez o desafio de interpretar o “homem da primavera”. Isso porque Babu já havia sido Tim Maia em longa biográfico lançado em 2014.

“Tim Maia” é um trap pesado e incomum. Foi composto por Bill em parceria com o DJ Tom Enzy de Portugal. Produzido por Fabrício Figueiredo, o clipe tem a temática dos anos 70.

Com muita gentileza, MV Bill aceitou responder algumas perguntas que enviamos. Aqui, você conhece um pouco sobre Tim Maia, e a ligação dele com MV Bill e o rap como um todo.

 

Matheus Luzi – Com este single, eu confirmo mais uma vez que a música não é somente música. Essa afirmação que faço é devido ao fato de que em “Tim Maia”, você faz da arte, uma síntese biográfica e artística desse revolucionário músico brasileiro, que como você mesmo versa “Foi barrado em vários lugares porque não escondia a sua opinião”. Parabéns!

MV Bill – Tim Maia é vida, Tim Maia é o nosso orgulho, a nossa referência. Mesmo antes do rap tomar sua independência das gravadoras, criando seus próprios selos, Tim Maia já tinha feito isso. Ele era uma grande referência, sempre será.

 

Matheus Luzi – Merece aplausos aqueles artistas que homenageiam gigantes como Tim Maia, ainda que o mesmo tenha sido mal interpretado por muitos. E isso você fez com calma, porém com intensidade. A alma está presente nessa música! 

MV Bill – Assim como eu acho importante o Snoop Dogg reverenciar o George Clinton nos Estados Unidos, e outras referências, acho importante ter essa reverência a Tim Maia, a Sandra de Sá, Zé Keti na parte do samba, e tantos outros nomes que fizeram histórias, mas não tiveram a visibilidade merecida, na sua época, no seu tempo. E hoje o rap nos dá essa possibilidade de homenagear alguém da antiga. Foi o que fiz no single, usando o trap.

 

 

Matheus Luzi – Se eu estiver equivocado, me avise. Mas, a sua homenagem ao Tim pode ser influenciada pela questão social em que o artista estava antes do sucesso e o grande reconhecimento surgirem, o que explica o quanto o público do movimento do Hip Hop precisa entende-lo.

MV Bill – Eu fiz a homenagem pro Tim Maia, pensando muito nas duas décadas de falecimento que acabou de completar há pouco tempo, e eu vi poucas manifestações de lembranças do Tim pela grandiosidade da obra dele, pela importância dele na música brasileira. E por isso, eu resolvi fazer essa homenagem. E eu fui muito influenciado e totalmente baseado pelo livro do Nelson Motta, “Vale Tudo – O som e a fúria de Tim Maia”, foi um livro que detalha bem muitos momentos íntimos do Tim Maia, e me guiaram bastante na hora de fazer essa homenagem pra ele.

 

Matheus Luzi – O verso “Ficar na brisa como Tim Maia” me faz pensar em viver a intensidade dele, algo que fazia parte de tudo que ele viveu, o que se manifestou nas suas canções.

MV Bill – Pô! Tim Maia era o maior tirador de onde que o Brasil já teve. Se a gente conseguir um dia ficar um pouquinho na brisa que o Tim Maia ficava, tirar um pouquinho da onda que ele tirou, a gente tá bem, vai ficar todo mundo numa boa, mais “relax”, mais tranquilo. 

 

(Foto: Rodrigo Freitas)

 

Matheus Luzi – Fugindo um pouco da análise da música como um todo, quero ouvir de você a importância de Tim Maia na sua vida pessoal e artística.

MV Bill – Além do Tim Maia fazer parte da minha herança musical, ele também estava muito presente dentro da minha casa, quando os meus pais eram casados, meu pai colocava a música “Cristina”, do Tim Maia, que era o nome da minha mãe. E meu pai começava a cantar pra ela, além de meu pai dizer também, que na época que eles moravam na favela Macedo Sobrinho, que é uma das favelas oriundas de onde surgiu a Cidade de Deus, o Tim Maia passava nos becos cantando vários sucessos dele, e tocando ideia com a rapaziada pela manhã. Então você imagina a situação! Ele reverberando aquela voz dele, naquele peitoral que é uma caixa de ressonância. A minha relação com ele é muito forte, e não tive o prazer de conhecê-lo pessoalmente, mas me sinto muito íntimo dele, por conhecer tão a fundo a obra dele, por conhecer muito a música dele, por ser próximo ao filho dele. Me sinto íntimo de Tim.

 

 

Matheus Luzi – Muitas vezes, os compositores de uma obra ficam a margem do reconhecimento. E por isso mesmo, quero te perguntar como foi a relação entre você e o seu parceiro de composição DJ Tom Enzy em “Tim Maia”?

MV Bill – A produção da música ficou por conta do Tom Enzy de Portugal. A internet trouxe várias possibilidades pra mim como músico. Uma delas foi a aproximação com produtores de outros lugares, e até então, eu tinha sempre os mesmos produtores, que são bons também, e que eu gosto de trabalhar, mas precisava conhecer outros produtores, até mesmo para poder trazer uma renovação musical, e uma dessas conexões aconteceu com o Tom de Portugal. E expliquei quem era Tim Maia, pedi pra ele fazer uma pesquisa para conhecer o trabalho, disse que não queria samplear, mas que queria um trap bem pesado, que representasse o Tim Maia dos anos 70. A primeira ideia que ele mandou, eu já vi que ele entendeu bem, o peso que era Tim Maia.

 

Matheus Luzi – O clipe produzido e dirigido por Fabrício Figueiredo resgata os anos 70 com elegância e nostalgia. Além de comentar o clipe, acho interessante você opinar musicalmente falando sobre um paralelo entre esse período que se passa o clipe e os tempos atuais.

MV Bill – Bom, no clipe, a gente teve a possibilidade de trabalhar com o Fabrício, que é um maluco maneiro, novo e jovem, e que consegue viajar através da pesquisa, dentro do que a gente quer. Mesmo sem ele ter vivido aquele período, o que acaba sendo uma coisa bem interessante. É importante destacar o trabalho dos figurinistas. A participação do Babu Santana, que fez o Tim Maia no cinema. Também foi de suma importância para que a gente tivesse uma atmosfera mais parecida com o que a gente queria, e levar tudo isso para os anos 70 foi um grande desafio, na qual o diretor teve que montar a peça. Acho que ele conseguiu atender bem, e eu fiquei muito satisfeito com o resultado. É um desafio pegar uma música com batidas atuais e colocar com imagens retratando momentos antigos. E acho que musicalmente, a gente tem alguns encontros. Traz a coisa atual, da música que a gente faz, mas respeitando muito e reverenciando muito o que foi feito no passado. Até porque muitas coisas que foram feitas dos anos 70 jamais serão reproduzidas ou alguma coisa feita similar ao que foi produzido naquela década. São coisas únicas e já viraram patrimônio mundial. Talvez, as músicas dos anos 70 são as que mais ouço. As músicas dessa década parecem que tem uma áurea diferente.

 

 

Matheus Luzi – Ainda no clipe, a brilhante participação de Babu Santana, que interpretou Tim no longa de 2014 “Tim Maia” acrescenta muito pelo fato do ator ter “vivido e encarnado” o músico brasileiro no filme biográfico. 

MV Bill – O Babu Santana é uma generosidade fora do comum. A gente já havia se esbarrado algumas vezes, mas nunca paramos para trocar ideias. Quando eu fiz o convite, ele só perguntou a roupa que era para estar, no caso, o figurino. Qual o horário e o local. Ele não quis saber de cachê, não quis saber nada, só queria estar presente, e agradecer imensamente pela participação. E como num filme, acabou se entregando pelo personagem no clipe. Uma curiosidade que é muito legal é que quando estávamos filmando na praia, algumas pessoas passavam de carro e o chamava ele de Tim, de Tim Maia. Acho que ele encarnou muito bem o personagem. Ele não é um imitador do Tim Maia, mas ele o interpreta muito bem.

 

Matheus Luzi – Se achar relevantes e curiosas, nos conte histórias sobre a música, o clipe, suas experiências e conhecimentos sobre Tim Maia.

MV Bill – Algumas coisas que aconteceram como curiosidade, é que a gente acabou sendo guiado pelo Tim. É que numa segunda parte, da primeira locação, seria feito uma rotatória no meio da rua, e aí veio um guardo municipal, e disse que não poderia fazer lá e nos indicou ir para uma praça, e já no final das filmagens, descobrimos que o nome dessa praia era “Tim Maia”. Depois fomos para o estúdio para fazer o cromo, que era a segunda locação, e descobrimos que a dona do estúdio foi assessora de imprensa do Tim Maia durante um tempo, e inclusive ela é citada no livro. Ela ficou muito emocionada com a nossa presença, por saber que era um clipe dessa natureza e ver o Babu caracterizado. Antes disso tudo, eu passei uma mensagem pro Carmelo Maia, filho de Tim, dizendo que estávamos fazendo essa homenagem. Achei importante avisá-lo, principalmente por conhecê-lo. Ele ficou muito feliz com o aviso. A gente já começou a fazer o clipe já abençoado pela família.

 

Matheus Luzi – Deixo você livre para dizer o que quiser. Essas perguntas que te fiz são o básico do básico. Por trás de Tim Maia e dessa música há um mundo a ser desbravado. E isso é lindo! Obrigado.

MV Bill – Dez! Eu fiquei muito feliz com o resultado do videoclipe, da música. Espero que o Tim também fique. Eu estou gostando bastante também da interação da galera, do público. Em alguns shows que eu já fiz depois do lançamento, mesmo sem ter a música incluída no meu repertório. Algumas pessoas comentaram a falta da música. Agradeço a oportunidade”.

 

 

 

 

 

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