Somos uma revista de arte nacional, sim! No entanto, em respeito à inúmeras e valiosas sugestões que recebemos de artistas de diversas partes do mundo, criamos uma playlist chamada “Além da BR”. Como uma forma de estende-la, nasceu essa publicação no site, que agora chega a sua 282ª edição. Neste espaço, iremos abordar alguns dos lançamentos mais interessantes que nos são apresentados.
Até o primeiro semestre de 2024 publicávamos também no formato de texto corrido, produzido pela redação da Arte Brasileira. Contudo, decidimos publicar apenas no formato minientrevista, em resposta aos pedidos de parte significativa dos nossos leitores.
Riverwoods x Jeanette Bengtsson – “Cruising” – (Suécia)
– Qual a melhor descrição desse lançamento? “Cruising” é uma faixa descontraída com muita alma. Tem uma letra inédita em inglês, de Jimmy Granstrom e Dave Prine, escrita para a música sueca “Du finns här“, de Lars Brundin, Herbert Tinz e Rebecka Molander.
– Qual reflexão ou ideia gerou essa música? Jimmy e Dave já tinham uma música anterior com o tema “Cruising“, e Jimmy achou que a sensação da palavra “Cruising” combinava bem com a música. A partir daí, ele queria torná-la relevante para os tempos em que vivemos e como as pessoas podem encontrar conforto umas nas outras em momentos difíceis.
– E a letra em especial, o que diz? A letra é pessoal e universal. Inicialmente, fala sobre encontrar um “quarto secreto” onde duas pessoas podem relaxar juntas, mas depois se transforma em reflexões mais universais: “O mundo está mudando, mas ainda somos os mesmos, uma era glacial mental, não conseguiu apagar nossa chama”.
– Musicalmente, como você a descreve? “Cruising” é um soft rock clássico com um toque de blues.
– Há algo de curioso que você queira destacar? A música tem vocais de Jeanette Bengtsson, que excursionou pelo mundo como cantora na banda cover do ABBA “Arrival From Sweden”. Ela também se apresentou e gravou vocais com o cantor e compositor Michael Stolt e sua banda, com o guitarrista do Roxette, Jonas Isacsson. Jimmy e Lars também têm uma conexão com o Roxette, já que sua colaboração anterior, “Only Summer“, resultou em transmissão no programa “Nordic Rox” da SiriusXM, coapresentado por Per Gessle. Por fim, Dave Prine veio de uma família musical (seu “tio John” é, de fato, o lendário John Prine). Quando não está anotando notas e acordes, ele trabalha na revitalização de línguas ameaçadas de extinção. Ele emprestou sua voz à dublagem navajo e ojibwe de Star Wars.
Respostas Riverwoods x Jeanette Bengtsson
Nazzy the Mic – “WASSUP” – (EUA)
– A melhor sinopse desta música que você poderia fornecer à alguém que ainda não a escutou? WASSUP é uma faixa cheia de energia e atitude, que mistura as ruas com letra inteligente. Tem aquela vibe ousada e direta, mas se você escutar com atenção, vai perceber camadas de vivência, personalidade e autenticidade. É o tipo de música pra ouvir quando você está se sentindo imparável.
– Qual reflexão ou ideia gerou essa música? Eu queria criar algo que mostrasse que posso rimar de igual pra igual com qualquer um, sendo fiel a quem eu sou. Muitas vezes tentam me colocar numa caixinha—mas essa faixa é sobre sair dessa caixinha. Me soltei, me diverti, e usei o beat como tela pra expressar o que penso, com leveza e verdade.
– O que diz a letra e qual sua mensagem? A letra fala sobre confiança, sobrevivência e assumir o controle da própria história. Toco em coisas que vivi, que presenciei, e mostro como lido com tudo isso. Não é só sobre ostentar—é sobre mostrar que passei por muitas coisas, evoluí, e continuo aqui, firme, com estilo e propósito.
– É possível estabelecer uma ligação desse lançamento com o seu país, os EUA? Com certeza. Essa música tem raízes na cultura urbana americana, especialmente na energia de uma cidade como Filadélfia. Dos carros à mentalidade, passando pela luta do dia a dia—ela reflete o que é crescer em lugares onde se expressar é uma forma de sobreviver, e confiança é essencial. É um som americano da forma mais criativa e real.
– Por fim, há algo de curioso que você queira destacar? Sim—tem um momento na música em que falo em francês: “Regarde-moi, regarde-toi, j’ai de l’argent.” Significa “Olha pra mim, olha pra você, eu tenho dinheiro.” É uma parte inesperada e divertida, que mostra como gosto de me destacar e misturar referências. E um fato curioso: gravei essa música em uma única sessão. Só eu, o microfone e o momento.
Respostas Nazzy the Mic
Ayo It’s Milk x AKA The Only One – “Way Out” – (Estados Unidos)
Descreva a proposta geral da música.
– AKA the only one: Do ponto de vista da escrita, a ideia nasceu do sample vocal. Eu queria expressar como a vida pode parecer sufocante às vezes, e como — mesmo quando parece não haver saída — podemos encontrar alívio através da música e da expressão criativa.
– Ayo It’s Milk: Comigo foi a mesma coisa. Encontrei um vídeo da Olya Holiday se apresentando na areia, e aquilo mexeu comigo. Me fez refletir sobre várias coisas do meu passado. Quis criar uma batida que sonoramente refletisse esse sentimento de isolamento (presente na melodia), ao mesmo tempo em que representasse o caos cotidiano (por meio da bateria).
Quando essa composição surgiu? O que inspirou vocês?
– AKA the only one: Toda sexta-feira, eu e o Milk fazemos lives criando músicas juntos. Essa faixa foi criada ao vivo, com o público assistindo. Quando ouvi o instrumental, fiquei empolgado e quis escrever na hora.
– Ayo It’s Milk: Chamamos nossa live semanal de “Ayo it’s Friday!”. Eu começo de manhã preparando as batidas, e à noite o AKA entra em live e escreve sobre elas. Essa música saiu do nosso primeiro episódio da série, e na hora sentimos que era algo especial.
E a letra — o que ela diz especificamente?
– AKA the only one: Ela fala sobre como me sinto perdido no dia a dia. Como se estivesse preso em um labirinto e a única saída fosse a música. Apesar de a vida artística parecer livre, existem muitos obstáculos até sermos realmente ouvidos. Essa faixa reflete esse sentimento e como lido com ele — rimando e trabalhando na engenharia do som.
– Ayo It’s Milk: O AKA conseguiu traduzir em palavras a emoção crua do sample vocal. É esse sentimento de estar mentalmente à deriva, que ele expressou de forma perfeita.
Musicalmente, como vocês descreveriam essa música?
– AKA the only one: É uma mistura etérea e impactante de gêneros, que soa como uma jornada por um labirinto. Como um canto de sereia te atraindo até que, de repente, aparece um farol te guiando de volta.
– Ayo It’s Milk: Eu diria que essa música tem o efeito “Hey Ya!” — uma vibe energética e dançante na superfície, mas com uma profundidade emocional nas letras do AKA que dá um equilíbrio único.
Como foi o processo de produção? O que vocês acham do som em geral?
– Ayo It’s Milk: Hora de falar nerdices! O sample original da Olya Holiday estava em 69 BPM, mas eu andava produzindo em tempos mais rápidos. Acelerei o sample e encontrei uma melodia perfeita em 200 BPM. Para a bateria, me inspirei no produtor da Costa Oeste iiinfinite, com uma vibe estilo Shoreline Mafia. A partir disso, deixei um grande espaço no beat para o AKA rimar com liberdade.
– AKA the only one: A produção do Milk é de outro nível. As escolhas experimentais e os samples vocais inusitados fazem nosso som se destacar. Nenhuma música soa igual à outra — você nunca sabe o que esperar, e isso é empolgante.
Galamba – “Sea Shack” – (Canadá)
– Descreva o significado geral da música. O título da música faz referência ao Sea Shack, um “albergue festivo” em Gaspésie, QC, onde a essência da música foi escrita.
– Quando foi criada e o que inspirou sua composição? A música é inspirada na natureza, na amizade e nos fios invisíveis que nos conectam. Nasceu de um reencontro de três amigos, cercados pelas belas paisagens de Gaspésie, QC, e pela energia contagiante e comemorativa do momento. Depois de escrever a essência da música com Bianca e Rodrigo, terminei a composição sozinho e chamei a banda para ensaios em preparação para a gravação. Inicialmente, a música não tinha introdução nem finalização quando começamos a ensaiar, então o baterista Sacha Daoud de repente exclamou: “Essa música precisa de uma introdução — algo como aquelas aberturas do Fela Kuti!”. Ele começou a vocalizar ritmos e golpes rítmicos na hora. Esse momento me inspirou a escrever tanto a abertura quanto o encerramento da música.
Há dois convidados especiais nesta faixa: Manoel Vieira, que toca piano Wurlitzer em um estilo que lembra João Donato, e, claro, Bianca Rocha nos vocais. Até bem tarde no processo de produção, a música não contava com vocais — as melodias foram originalmente concebidas para serem tocadas apenas com violão. Mas algo parecia faltar, e percebi que era a presença da Bianca. Liguei para ela e, assim que ela colocou os vocais, a música inteira se encaixou.
– Musicalmente, como você pode definir e descrever esta música? A ideia por trás da música que compus para este álbum é misturar estilos tradicionais da música brasileira com outros gêneros que amo, como jazz, funk e rock, de uma forma que reflita minha carreira como músico e que pareça única e pessoal. O objetivo era “disfarçar” alguns desses ritmos tradicionais, criando novos grooves a partir desses estilos antigos. Portanto, a intenção não era fazer um disco tradicional de “música brasileira”, mas sim algo que borrasse as linhas de gênero, influenciado pela minha experiência como músico acompanhante que navegou por muitas comunidades e estilos musicais diferentes.
O clima geral das composições é de alegria, otimismo, ludicidade e vibração, equilibrado por uma pitada de nostalgia e introspecção.
– Como foi elaborada a produção musical e o que você acha da sonoridade geral da música? Embora a música tenha raízes em um ritmo tradicional, esses elementos não são explicitados na produção. A ideia era mesclar diferentes referências para criar algo único — nem excessivamente brasileiro, nem excessivamente jazz fusion. A escolha dos sons (como um solo de guitarra wah-wah) e o estilo de execução também contribuem para a confusão entre os gêneros.
Respostas Galamba
T1NΔ – “Noch für eine Zeit” – (Alemanha)
– Quando é que esta composição foi criada e o que a inspirou? A composição amadureceu na minha cabeça no final do ano passado. Estava sentado à cabeceira de uma grande amiga que estava nos cuidados intensivos e que corria risco de vida. Ela tem uma doença renal crónica e os medicamentos imunossupressores que toma após um transplante de rim conduzem repetidamente a situações de risco de vida, porque o seu corpo não consegue defender-se bem contra vírus e bactérias invasores.
– E o que diz exatamente o texto? Fala da situação em que estou sempre ao lado da minha amiga nestas situações difíceis. Vejo-me como se estivesse sentado num barco, enquanto a minha amiga navega ao meu lado no seu próprio barco, que está sempre a afundar-se. A minha amiga é dura. Isso significa que ela continua a emergir e não é engolida pelo oceano. Mas a canção também mostra a falta de palavras, a tristeza profunda e a esperança de cura.
– Como descreveria esta canção em termos de som? Voz feminina suave, jazz, sensual, quente e calma.
– Como é que decorreu a produção musical e as gravações em estúdio? Escrevi a letra e criei a música com a ajuda de AI (Suno).]
– Há alguma coisa em particular que gostarias de realçar? Estou muito orgulhoso por ter conseguido encontrar e sentir nesta canção o estado de espírito exato que senti ao lado da cama.
Desejo a todos os que foram submetidos a um transplante muito amor e luz, força, calor e vigor.
Respostas T1NΔ