Sob encomenda para a Arte Brasileira, o jornalista Daniel Pandeló Corrêa coletou e organizou comentários de onze artistas da nova música brasileira sobre álbuns lançados neste 2023, mas também um de 2022, de 2017, e outro de 1973. Um jeito diferente de listar os “Melhores do Ano”. Vale dizer que esta publicação é a estreia de um novo quadro da Revista, onde iremos publicar mensalmente coleções de comentários de pessoas qualificadas sobre os mais diversos temas artísticos.
andré LR mendes indicou Chico Buarque e Mônica Salmaso – “Que Tal um Samba? (Ao Vivo)”
Não é um álbum de inéditas mas “Que Tal Um Samba (ao vivo)” é de uma beleza, de uma qualidade artística tão intensa no encadeamento das canções, que conta histórias que contam a história do momento em que ele foi concebido (ainda sob o inferno do fascismo tropical bolsonarista)… Mas mesmo assim, com esperança de ultrapassar (como, ufa! , ultrapassamos) a via crucis sem sermos crucificados e renascer como país. Junto ao repertório, vem o que tem de mais ímpar nesse álbum dentro da discografia genial de Chico Buarque: a voz sem par de Mônica Salmaso.
Sarah Abdala indicou Marcelo Jeneci – “Caravana Sairé”
Em “Caravana Sairé”, Marcelo Jeneci revisita canções da música brasileira compostas por Luiz Gonzaga, Accioly Neto, Antonio Barros, entre outros. O que eu mais amei nessa produção é a mistura de gêneros brasileiros, como o forró, o baião, com outros estilos musicais, como o reggae e a música flamenca, além de trazer um frescor na produção musical com os synths, synth bass, e efeitos no acordeom, por exemplo. Esse disco é uma linda homenagem à música brasileira, à música nordestina, com Jeneci cantando lindamente e com a sanfona dando o tom em tudo. Uma aula de música brasileira.
Artificial Complex indicou Arturo e a Cidade Devastada – “A Pior Pessoa do Mundo”
Pra mim (Érico), o trabalho nacional mais importante esse ano foi dos meus conterrâneos da Arturo e a Cidade Devastada, chamado “A Pior Pessoa do Mundo”. A importância desse trabalho pra mim está no fato de ser algo novo e super atual em relação à nossa cidade (Teresina). É uma carta aberta sobre as particularidades de viver nessa cidade devastada e ainda por cima falar de peito aberto sobre a atual situação das coisas de um ponto de vista emocional. Sinceramente, poder ter feito uma ponta nesse álbum na última faixa é de um orgulho inenarrável. Simplesmente um trabalho impecável.
Jotadablio indicou Menores Atos e Nova Orquestra – “Ato I”
Estava pronto para escrever algumas linhas sobre um sambista recriando canções de um medalhão da MPB, mas estou certo que esse disco já vai aparecer em muitas recomendações por aí. Aproveito, então, para escrever sobre o EP “Ato I”, dos menores atos com a Nova Orquestra, lançado na reta final do ano. Apesar de 5 das seis faixas serem regravações, os novos arranjos destacam ainda mais as belas melodias da banda carioca. Gosto muito da sinceridade tocante que o Cyro consegue passar em suas letras, mesmo quando extremamente diretas.
Relvas indicou Ferrugem – “Interessante”
Dentre as inúmeras e diversas músicas de diferentes discos que ouvi esse ano, acredito que o álbum “Interessante” do Ferrugem tenha sido o que mais me marcou e, provavelmente, foi o disco nacional que eu mais ouvi durante esse ano de 2023. Apesar da minha sonoridade como artista ser bastante ligada ao seguimento do Pop e R&B, eu sou muito fã de pagode desde criança, ouvindo junto com a minha família em festas e confraternizações. Por conta dessa minha relação com o pagode, atualmente o Ferrugem é um artista que eu tenho muito como referência, principalmente levando em consideração a questão vocal – visto que ele faz melismas com maestria e com um alcance vocal absurdo. O álbum “Interessante” me marcou por dois motivos principais: as linhas de composição que abordam as diferentes fases de um relacionamento de uma maneira muito única e os desenhos melódicos que o Ferrugem faz nos vocais. Além disso, em agosto desse ano, alguns dias antes do lançamento do álbum, eu tive a oportunidade de realizar um dos meus sonhos ao cantar no palco ao lado do Ferrugem, em um show no Rio de Janeiro. Com certeza foi um momento único, que estará sempre na memória e, sem dúvidas, intensificou ainda mais a minha relação com as músicas dele, pois ganharam novos significados a partir desse dia.
Meyot indica Leo Fazio – “Cyborgias”
Leo Fazio resgata aquela antropofagia modernista brasileira com uma ótica 100% situada no tempo presente. A forma como elu aborda questões urgentes como relações de trabalho e avanço do neoliberalismo, ora satírica, ora soturna, com misturas sonoras que vão de batidas de funk a Adoniran Barbosa, é brilhante. Um discaço que não vimos sendo muito comentado por aí e que merece demais a audição.
IIGOR indica Viratempo – “CIDADE TROPICAL PENSAMENTO”
O álbum “CIDADE TROPICAL PENSAMENTO” da Viratempo, lançado recentemente, chegou como um presente de fim de ano no meu Spotify e se tornou meu fiel companheiro, [haha]. A mistura que vai do brazilian boogie ao neo soul, me conquistou de verdade. Encontrei muitas semelhanças com artistas que estão constantemente nas minhas playlists, como Jungle, Kaytranada e Daft Punk, e achei incrível como essas referências foram habilmente incorporadas com toques brasileiros. Já estava na expectativa por esse álbum desde o lançamento do single “SOLAR,” que adiantou perfeitamente essa vibe solar presente em todo o álbum.
GRITTO indicou dois, um de 2022 e outro desse ano.
“GARCIA” – Victor Xamã (2023)
Uma obra de arte de poesia e produção em um momento da música em que poucos álbuns conseguem se mostrar como uma obra completa. Pra mim foi especial nesse ano em que mudei de cidade, porque me traz a conexão de quem precisa estar longe de casa pra viver o sonho. Um álbum que prova a grandiosidade musical e artística que o rap nacional tem.
“JARDINEIROS” – Planet Hemp (2022)
Acredito que esse álbum foi um grande acontecimento nesse ano, tanto pelo fato de ser um álbum de “retorno” de uma das maiores bandas do país, quanto pelo que ele significa nesse momento político e social do Brasil e do mundo. E as músicas, claro, representam muito do potencial de pluralidade do Brasil.
Pedro Santos falou de um de 1973 e um desse ano:
Domenico – “Sramba” (2023)
Dos lançamentos deste ano, gostei muito do disco “Sramba” do Domenico Lancellotti, por ser uma combinação das raízes do samba com uma intervenção pesada da música eletrônica. Acho que isso é feito de uma maneira muito interessante e que permite uma conexão inesperada e cheia de surpresas.
Gal – “FA-TAL” (1973)
Eu recuperei na minha coleção de vinil “FA-TAL – Gal a todo vapor” e foi o disco que mais me acompanhou esse ano! Esse disco já era um dos meus prediletos e quis revisitá-lo porque estava à procura da energia vibe desse show para o EP que estava gravando. Especialmente, o espírito de uma banda dos anos 70, com guitarristas que amo. A direção musical do Lanny Gordin e Pepeu que tocou em alguns shows e aparece em algumas das músicas do vinil! Somando a esse time, vem Macalé, Jorginho Gomes e Novelli pra formar uma banda impecável que pudesse sustentar o poder de Gal Costa cantando. Um disco conceitual, teatralizado, gravado ao vivo na efervescência de 1971, cercado de chumbo e censura, e que é uma afirmação da música brasileira na sua melhor forma e formato. Eu fiquei viciado nas histórias e bastidores dos shows e desta gravação (torço pra que a captação do Menescal e as imagens do Leo Hirszman saiam algum dia em audiovisual!). A história que me marcou foi a que eu li no artigo do Mauro Ferreira (g1) de que a ordem no LP veio invertida, ou seja, as duas partes do show, o bloco elétrico e o bloco acústico vieram trocadas. Então, fiz questão de corrigir o erro histórico e escutar cem vezes na ordem correta, como foi desenhada por Waly Salomão. E mais do que tudo, ouvir Gracinha cantando com sua voz-instrumento e mostrando que ela dominava a sua benção com tanta versatilidade e brilho.
Camilo Solano indica Bruna Caram – “Afeto e Luta – Bruna Caram Canta Gonzaguinha”
O disco em que a Bruna canta Gonzaguinha foi um dos meus preferidos de 2023. Não só por ser apaixonado pela obra de Gonzaguinha, mas também por ver como a Bruna resolveu interpretar cada canção, sempre muito, forte do artista. A Bruna é uma amiga querida e também professora de canto. Acompanhar e aprender com ela sempre é enriquecedor, com Gonzaguinha ainda como inspiração, tudo fica mais incrível ainda.
Will Magalhães indica Daniel Santiago e Pedro Martins – “Simbiose” (2017)
Um álbum que foi bastante importante pra mim nos últimos 2 anos, na verdade, é o Simbiose, dos guitarristas Daniel Santiago e Pedro Martins. É um álbum que mergulha no universo da guitarra, harmonias e melodias. É um duo formado por gigantes da guitarra mundial, grandes referências para o instrumento e que tem uma abordagem moderna e sofisticada sobre a música, principalmente, sobre o violão e a guitarra.