Eduardo Pastore é cantor, compositor, gestor público, literato e poeta, e, sobretudo, um apreciador feroz da democracia. É o amor por este sistema político que originou seu novo single, uma canção folk que recebeu o nome “Hoje”, não à toa. O caloroso dia 8 de janeiro deste 2023, quando grupos bolsonaristas atacaram e invadiram a Sede dos Três Poderes em Brasília-DF, recebeu alguns apoios ao redor do país, ainda que muitos deles abafados. Um desses apoiadores era um amigo de longa data de Eduardo Pastore. Foi, então, o que deu corpo e razão para esta música.
O “hoje” dito por Eduardo Pastore é de significado duplo. O primeiro é uma referência ao dia em que descobriu o apoio de seu amigo à tentativa de golpe, quando entendeu “que naquele momento não há mais qualquer amizade a ser mantida”. Por outro lado, o “hoje” simboliza 8 de janeiro de 2023, data do qual Eduardo acredita que deva ser gravado para sempre como uma memória triste da democracia brasileira, com o intuito de que não se repita. “Lembro-me de uma cena que é simbólica do que aconteceu naquelas quatro horas de invasão, quando um vândalo esfaqueou a tela consagrada do Di Cavalcanti. Ali entendemos que as invasões não tinham qualquer proposta política. Na verdade, a proposta é a própria destruição. A destruição da democracia, da cultura e da civilização.”, enfatiza Eduardo.
Ele reforça o seu posicionamento crítico: “Creio que reflete uma tristeza, de testemunhar que pessoas conhecidas aderiram à extrema direita. Reflete também um cansaço, dado que não podemos ficar mudos com esse tipo de comportamento. E claro, reflete uma ruptura. Não podemos continuar num diálogo com quem defende a destruição da democracia. Penso, tristemente, que talvez não haja retorno para quem entrou nesse processo de dissonância cognitiva, de viver num mundo paralelo de notícias falsas, e que está se engajando em comunicação e atos violentos. Os remédios para esses atos são a responsabilização pela Lei e aplicação da Justiça.”.
A capa de “Hoje” também tem um significado profundo, embora exija uma explicação. A imagem de um homem em frente a um aquário com peixe dourado é do iraniano Hassan Almasi com edição do próprio Pastore. A arte, portanto, se refere a “Peixe Dourado”, nome de um importante livro do autor J. M. G. Le Clézio e que chega a ser mencionado na música, no segundo verso. A obra de mais de 200 páginas é descrita por Eduardo como tendo os fluxos migratórios forçados por catástrofes políticas e econômicas como tema, envolvendo a discriminação, o racismo, a xenofobia, dentre outros males. Desta forma, podemos entender que Eduardo Pastore faz uma analogia a “Peixe Dourado” ao que acontece no Brasil de hoje e o que pode acontecer no Brasil de amanhã, embora reconheça que a esperança e empatia são as armas necessárias para resistir.
Vale (e vale muito) destacar que “Hoje” é o terceiro fragmento do álbum “Terra de Ninguém”, que ainda não tem data definida de lançamento. E para finalizar esta reportagem, uma conclusão de Eduardo a respeito do Brasil e desta música: “Me refiro ao 8 de janeiro de 2023, um dia que deve ser lembrado para sempre na história do Brasil. Nesse dia que vi o amigo apoiando a barbárie”.
Ficha técnica
Música e letra: Eduardo Pastore
Vocal: Eduardo Pastore
Produção musical e bateria; Maurício Hoffmann
Violão, guitarra, teclado, baixo e arranjos: Rafael Reis
Vídeo: Vitrola Play